quarta-feira, novembro 26, 2008

A dignidade na obrigação da verdade

Com a devida vénia ao Diário de Aveiro
«Quando olhamos um espelho, pensamos que a imagem à nossa frente é exacta. Mas basta movermo-nos um milímetro para a imagem se alterar. Aquilo que estamos realmente a ver é uma gama infindável de reflexos. Mas às vezes o escritor tem de quebrar o espelho — porque é do outro lado do espelho que a verdade nos encara. Estou convencido de que, apesar dos enormes obstáculos existentes, há uma obrigação crucial que recai sobre todos nós enquanto cidadãos: de com uma determinação intelectual inflexível, inabalável e feroz, definir a verdade autêntica das nossas vidas e das nossas sociedades. É de facto uma obrigação imperativa. Se essa determinação não se incorporar na nossa visão política, não tenhamos esperança de restaurar aquilo que já quase se perdeu para nós — a dignidade do homem.»

Este texto acima transcrito, extraído do “Discurso de Aceitação do Prémio Nobel” de Harold Pinter, sugere-nos uma inserção perfeita, e uma reflexão profunda, aos momentos mais duvidosos e mais críticos da actualidade portuguesa.

O descrédito generalizado que se instalou nos portugueses, provocado pelo mau funcionamento e pela corrupção nas Instituições, no Estado, e em última análise nas mais altas figuras responsáveis da nação, levou a um clima tão caótico de desconfiança, que se torna emergente “quebrar todos os espelhos”, de uma vez por todas, ainda que doendo, chiando, gemendo… a ver se ainda é possível encarar do lado de lá desses espelhos, a verdade autêntica, e marcar um novo ponto de partida.

Os obstáculos são infindáveis, mas temos de exigir a verdade, não podemos continuar a aceitar “meias-verdades”, não podemos continuar a pactuar com “o faz de conta”, não podemos permitir que a nossa sociedade se torne um circo de vaidades, onde tudo se permite e nada é obrigado. Temos o direito e o dever de exigir esclarecimentos, sem medos e sem receios das consequências. Pior do que conhecer a verdade, por muito que ela nos doa, é constatar que somos enganados!

Afinal quem mente e quem fala verdade?

- Não queremos mais desculpas, nem justificações, queremos a verdade.

Que estourem todos os “casos”! Escândalo BCP, escândalo BPN, escândalo BPP, escândalo Casa Pia, escândalos estatais, escândalos municipais… que envolvam tudo e todos que tiverem de envolver… desde Fátimas Felgueiras, a Pedrosos, a Jardins, a Loureiros, a quem preciso for…. se todos estiverem na senda da dúvida de crime e da desconfiança para o cargo que ocupam. Mas que haja justiça e verdade nas sentenças, não nos continuem a enganar.

Infelizmente, a crise económica que atravessamos é tão avassaladora, que em breve se tornará impossível continuar a alimentar as “bocas do sistema”, e portanto, em breve se saberão muitas verdades só possíveis de despoletar quando se chega ao “fundo do poço”. Portugal está a caminho, mas quem sabe, por vezes nas crises, aliás como na própria vida, há males que vêm por bem, e depois de assaltados trancas à porta!

Temos pois a esperança, que após uma “limpeza geral” à nossa Pátria, que a todos nós sairá muito cara, dado o preço da verdade, se tornará possível voltar a restaurar «aquilo que já quase se perdeu para nós – a dignidade do homem», como nos designou um dia Harold Pinter.

Susana Barbosa
1ª Signatária do Partido da Liberdade
(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

quarta-feira, novembro 19, 2008

O regresso à terra

Com a devida vénia ao Diário de Aveiro

«O REGRESSO À TERRA, MAIS DO QUE UMA VONTADE, TERÁ DE SER JÁ NA PRÓXIMA DÉCADA UMA URGÊNCIA, PORQUE SE TRATA DE UMA NECESSIDADE»

«PORTUGAL CORRE HOJE SÉRIOS RISCOS PELA SUA DEPENDÊNCIA DO EXTERIOR, E ESTA SITUAÇÃO É TRANSVERSAL A TODOS OS SECTORES, MAS NA AGRICULTURA E PESCAS, A SITUAÇÃO É AINDA MAIS CAÓTICA»
«Portugal importa 70% dos alimentos que consome, o que traduz uma inversão completa do cenário anterior, em que esses 70% correspondiam à auto-suficiência alimentar do País». Esta foi a principal conclusão do 3º Colóquio Nacional de Horticultura Protegida, que decorreu dias 7 e 8 de Novembro deste ano, no Auditório Municipal da Póvoa do Varzim, conforme noticiado pelo Jornal de Notícias (JN).

Os 200 produtores, empresários e investigadores, que reuniram na Póvoa do Varzim, concluíram pelo «falhanço da economia de mercado», nas palavras do presidente da Associação Portuguesa de Horticultores (APH), Manuel Soares, e reclamaram a regulação do mercado interno, e a concessão de incentivos para a competição no mercado internacional.

Já em Maio passado, dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) de um estudo realizado entre 2003 e 2006, nos alertaram para a preocupante situação de dependência em que Portugal se encontra, face às crescentes percentagens de importações de produtos alimentares. Quando se analisam por exemplo, produtos da nossa base alimentar, como os cereais produzidos no nosso país no ano de 2006, a situação torna-se ainda mais grave, pois apenas 16 por cento das necessidades internas são colmatadas pela agricultura portuguesa. No estudo apresentado, dados do INE indicam que o país importa mais de 90 por cento do trigo e da cevada consumidos, cerca de 70 por cento do milho, e mais de 60 por cento do centeio.

Importa pois, que estes dados não continuem a passar à margem das preocupações de quem nos vem (des) governando. Fechar os olhos a esta realidade, é contribuir para o profundo desequilíbrio de uma nação e para a sua inequívoca dependência do exterior. A globalização desenfreada asfixiou as economias agrícolas dos países mais pobres, e por sua vez, a terra deixada ao abandono constitui uma menos-valia para as gerações vindouras, que não reconhecem hoje na actividade agrícola uma forma digna de vida e de gerar riqueza, nem identificam na terra e na natureza a sua verdadeira importância para o progresso e para a auto-suficiência de um povo.

Uma nação que não cuida dos seus recursos naturais, será sempre uma nação aculturada e sem estratégia de futuro. Por muitas tecnologias de que possa dispor um povo, se as mesmas não forem colocadas ao serviço das suas necessidades básicas, de nada servirá essa pretensa evolução, pois faltar-lhe-á a sustentabilidade, que se aliará sempre à falta de independência.

Portugal corre hoje sérios riscos pela sua dependência do exterior, e esta situação é transversal a todos os sectores da economia, mas na agricultura e pescas, a situação é ainda mais caótica, porque perdemos a capacidade de explorar a nossa própria riqueza natural. As políticas de redução de cotas agrícolas e pesqueiras, em troco da ilusão de maiores fundos comunitários temporários, transformam-se agora num pesadelo, e Portugal tem de perceber a urgência de inverter políticas e mentalidades, a fim de ainda salvar a soberania que nos resta.

Receber subsídios para não produzir, fez parte de “resmas” de pacotes políticos absurdos de políticas de facilitismos. Hoje já estamos a pagar um preço elevado pelas asneiras cometidas pelo capitalismo global, e pelos desafios que as sociedades provocaram às próprias leis da vida. Mudam-se os tempos, mudam-se as necessidades, alteram-se os vícios e as vontades.

O regresso à terra, mais do que uma vontade, terá de ser já na próxima década uma urgência, porque se trata de uma necessidade. Reconhecer o valor da sua riqueza natural, será para cada povo o retorno às suas origens, à sua cultura, às suas tradições, ao recriar e ao reinventar de novas formas de vida, que substituam o “abandono” da agricultura e a “desertificação” hoje latentes, e que a par da modernidade adquirida, valorizem o que de mais nobre temos ao nosso alcance: a própria natureza e a liberdade de continuarmos independentes!

Susana Barbosa
1ª Signatária do Partido da Liberdade
(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

quarta-feira, novembro 12, 2008

In-Justiças

Com a devida vénia ao Diário de Aveiro

É realmente extraordinária a falta de qualidade democrática que vivemos na actualidade em Portugal! O défice democrático traduzido pela actual maioria absoluta é tão grande, que ouvir falar de viver em “ditadura” passou a ser de novo lugar comum. A falta de liberdade, é portanto uma realidade, a partir do momento em que são ignorados os protestos dos cidadãos, por muito representativos que estes possam ser, e são exaltadas e inflexíveis as decisões de quem governa.

Será de crer que 120 mil professores de todo o país, que representaram na manifestação do passado sábado cerca de 85% desta classe em Lisboa, sejam todos destituídos de bom senso, e que sozinha a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, seja dona da razão?

São cegos e surdos governantes deste calibre, e Maria de Lurdes Rodrigues já deveria ter aprendido a lição com o seu colega Correia de Campos, ex-ministro da Saúde. Mas não, esta senhora protegida pela alucinação do poder, continua a reafirmar do alto do seu pedestal que rigorosamente nada se alterará, e que será para cumprir o modelo de avaliação dos professores porque, afirmou, «é o melhor para o país»!

Mas afinal em que país vivem este tipo de governantes?

Provavelmente não vivem no país, vivem apenas dentro de confortáveis gabinetes, onde planeiam projectos obsoletos, porque acreditam que a sua confortável maioria não lhes exige a necessidade de reinar sob a maçada de estudar os problemas reais, e de viajar pelo país real. Eles só se dignam a sair dos gabinetes para a sua vida pessoal, ou para receber os focos das luzes da ribalta que lhes continuam a ofuscar o pensamento, porque lhes oferecem um lugar inequívoco, e um tempo de antena privilegiado, nas “caixinhas” que ainda acreditam que fazem mudar o mundo.

Estão enganados. E infelizmente os tempos dar-nos-ão a razão. O mundo cá fora está em mudança e os erros têm sido tantos, que não haverá propaganda nem poder mediático que lhes valha. Ao contrário do que muitos pensam, o povo português está atento e prova disso foi o “peso” da manifestação de sábado, e estes professores, eles próprios enganados durante anos pela ilusão do socialismo, saberão reconhecer o seu equívoco, e na altura certa não se inibirão de levantar o merecido “cartão vermelho” a esta escandalosa governação.

Entretanto, as “in-justiças” continuam, e perante acusações de mais de duas dezenas de crimes, outra senhora do sistema, Maria de Fátima Felgueiras, vangloriou-se em praça pública pelas reconhecidas absolvições, e pasme-se, pela sua entendida vitória em tribunal… e quem somos nós, simples mortais, para duvidar das “ditas provas”, para duvidar dos juízes, ou para duvidar da justiça em Portugal?

Não admira pois, que no final do passado mês de Outubro, a OSCOT (Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo), organização presidida pelo general Garcia Leandro, que é uma associação científica e cultural da sociedade civil sem fins lucrativos e que tem como objectivo a investigação, o ensino, o debate e a divulgação das questões de segurança, tenha apresentado um relatório de estudo onde em entre outras conclusões, se percebe que os portugueses acreditam nas forças de segurança, mas não nos tribunais, pois segundo o estudo «Quase metade dos portugueses acham Portugal “razoavelmente seguro” e a maioria acredita nas forças de segurança, mas manifesta “pouca confiança” nos tribunais».

Não é admissível que o Plano de Prevenção ao Suicídio, criado pelo Ministério da Administração Interna, se demonstre tão pouco atento, tão pouco sério e ineficaz com as forças de segurança em Portugal. E não será por acaso que a pressão e o stress inerentes à profissão, continuem a levar militares da GNR e polícias ao suicídio, enquanto que ao que sabemos, os senhores juízes, senhores das suas sentenças, continuem imperturbáveis e a dormir descansados.
Susana Barbosa
1ª Signatária do Partido da Liberdade
(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

Outono em flor

«O Outono é uma segunda Primavera em que cada folha é uma flor»

Albert Camus

quinta-feira, novembro 06, 2008

Os jovens no avesso do futuro

Com a devida vénia ao Diário de Aveiro
As sociedades que seguiram o “mote” do capitalismo “ultra-radical”, são as mesmas que esvaziaram os jovens de princípios e valores. Estas sociedades venderam de tudo para saciar os jovens: jogos, consolas, computadores, música, moda, drogas, e até dinheiro fácil… mas afinal apenas venderam, e o principal objectivo resumiu-se à ganância do lucro. E quem fica então, para oferecer algo de bom às gerações que constituirão o futuro? Parece-nos que muito poucos para dar, e multidões para lucrar… E para lhes dar o exemplo? Isso então nem pensar!

São inúmeras, as lamentações que nos chegam todos os dias da parte de jovens que nos questionam sobre o futuro. Insegurança, crise na economia e na educação, dificuldades de habitação, desemprego, precariedade de «contratos a prazo» e de «recibos verdes», fazem a vida dos jovens «andar para trás», ou pior ainda, empurram mesmo os nossos jovens para a marginalidade.

Hoje, as novas gerações em vez de representarem a força e a esperança num futuro melhor, invertem o percurso natural da própria vida, que nos devia fazer acreditar na sua energia e criatividade, e mergulham num mundo de incertezas, sem esperança nem vontade para investir num futuro melhor. As sociedades capitalistas destituíram os jovens da capacidade de resistir às dificuldades, fazendo-lhes crer que como que por magia tudo se consegue «ter». «Ter e ter, e mais ter» … foi lema do facilitismo deste mundo feito à pressa. Para trás ficou o educar, e o «ser»!

Os nossos jovens, crescem assim com o futuro hipotecado à nascença. Os seus objectivos de curto prazo são «ter» casa e «ter» carro, o mais rápido possível, e para que tal aconteça, endividam-se até não poderem mais… Depois vêm as agruras da vida, com a perda de um emprego, ou a instabilidade do recebimento do salário, que os atira para as ruas da amargura, sem sustento para as muitas obrigações que foram assumindo.

Assim, os jovens vão perdendo a capacidade natural de empreender e de arriscar, na fase que deveria ser a mais inovadora das suas vidas. Os jovens de hoje são de tal modo enredados por um sistema fútil e supérfluo, que na sua maioria não lhes resta sequer tempo para questionar e pensar. As suas vidas apressadas num rodopio de competitividade desde a mais tenra infância, não lhes deixam tempo para a reflectir ou contemplar.

Os jovens dos nossos dias vivem sufocados e sem liberdade de acção, a pensar se o «vil metal» lhes permitirá sobreviver até ao final de cada mês. Perdem as energias a pensar nas contas da água, da luz, do gás, das prestações disto e daquilo para pagar. A sociedade de consumo foi montada para isso mesmo, para que não lhes reste tempo para mais do que trabalhar, consumir e pagar! Entralham-se de tantas coisas que de pouco servem, que esta sociedade lhes impinge, que nem percebem que empobrecem assim as suas vidas.

Falta aos nossos jovens a educação, a liberdade com responsabilidade, o espírito de sacrifício, e sobretudo o «exemplo», pois não identificam nas gerações supostamente maduras, o respeito e a dignidade que deveria ser o fio condutor das suas vidas. Hoje a crise de valores é tão grande, que estamos num mundo que já não oferece nada, só vende! À medida que os factores de risco se agravam no percurso dos jovens, os testemunhos que os adultos lhes deixam como herança, são insuficientes para lhes demonstrar que vale a pena mudar. Os valores da intriga, da inveja e da mediocridade social e política, enfraquecem os jovens desacreditando-os, e levando-os mesmo por vezes a prolongadas depressões.

Só podemos ter um mundo melhor, se nos consciencializarmos, todos, na emergência de investir na formação, estímulos e incentivos dos nossos jovens. Sem uma juventude sã, e com jovens insatisfeitos não haverá esperança que nos valha, mas nada neste mundo muda se não houver quem tente, e são urgentes políticos e políticas renovadas, para uma intervenção capaz e necessária dos jovens, na evolução e desenvolvimento das sociedades. Por um mundo mais livre e mais justo.
(publicado na edição de ontem do Diário de Aveiro)