domingo, dezembro 04, 2005

Recordando Eça (II)

... - Pouh! - fez Nazareno com nojo. - Que sociedade, que asco! Não, realmente, o Matias tem razão, é humilhante lutar contra uma tal sociedade! A luta supõe forças que se encontram; mas assim, temos de um lado a força, do outro a pústula! Pouh! Portugal não deve ser reformado, como diz Damião, deve ser queimado a nitrato de prata!...

Estavam no Terreiro do Paço: uma lua lívida deixava cair de entre as nuvens uma mancha luminosa sobre a água sombria.

- Tudo isto precisa ser arrasado! - disse ainda Nazareno, mostrando em redor as Secretarias negras, de uma uniformidade enfática. Tinha parado e olhava, apertando com cólera o cabo do guarda-chuva, toda aquela reunião de edifícios oficiais, como a pesada e antiquada personificação de regimes funestos - o Banco e o seu ágio, a Alfândega e os seus direitos, os Ministérios e o seu burocratismo - ...

Eça de Queiroz, in A Capital